quinta-feira, 1 de março de 2012

Prá não dizer que não falei das flores...

Imagem: http://emeceara2011.blogspot.com
                 
Já começaram os comerciais de promoção e descontos. Inúmeras promoções de eletrodomésticos, que prometem acabar com o sofrimento das mulheres na cozinha e no lar, reforçando a ideia e comportamento que coloca as tarefas domésticas como uma atribuição das mulheres.


Os diretores lojistas sempre dão um jeito de esquentar o comércio nessa época do ano, que corresponde a uma certa 'entressafra', já que somente no mês de maio as vendas voltam a disparar. Então, entre o carnaval e o mês das mães e das noivas tem... o 8 de março! 

Então eles inventam de tudo e de certa forma tem se apropriado comercialmente de uma data que é muito, mas muito especial mesmo para os movimentos feministas e de mulheres. Como todo mundo já sabe, o 8 de Março é o Dia Internacional da Mulher.

Imagem:Google
Já faz alguns anos que isso vem acontecendo. Nas repartições, o chefe (ou a chefa) compra as rosas vermelhas e distribui com as funcionárias. Geralmente o próprio (ou a própria) se encarrega da tarefa de fazer a entrega. Abre aquele sorrisão, cheio das boas intenções, dá "os parabéns" e entrega o presente que muitas vezes fica lá no copo à espera do final do expediente para só então ser levado dali. 
Tem também aqueles que providenciam um café da manhã, onde todos sorriem e cumprimentam as mulheres dando os parabéns pelo "seu dia". 

Claro que sempre tem os colegas de trabalho que correspondem ao estilo 'perdem um amigo, mas não perdem a piada' e dizem coisas que juram e acreditam ser engraçadas como "Aproveite bem, que só tem hoje" ou "Ainda não entendi porque tem um dia da mulher e não tem nenhum dia do homem". E todo mundo ri daquelas piadas horrorosas e sem graça.

Bom, tem também os maridos. Os irmãos. Os amigos. O porteiro do prédio. Todos em uníssono a lhe cumprimentar, dando "os parabéns" pelo seu dia. E, claro, você é testemunha viva de gentilezas, todo tipo de mimo e agrados que a imaginação deles permite para mostrar o quanto reconhecem o dia da mulher. 

Claro que tem também as promoções de motel, afinal de contas eles acreditam às vezes sinceramente que é também dia de fazer um agrado à "patroa". E muitas vezes as promoções se estendem por todo o mês de março. Lojas de departamento, salão de beleza, cosméticos e maquiagem e tudo que for possível associar as vendas às mulheres.   

Clara Zétkin e Rosa Luxemburgo
(Imagem: Google)
Não tenho nada contra os mimos, gentilezas, presentes e outras e delicadezas, embora eu tenha cá as minhas restrições a incentivar o consumismo. 
O Dia Internacional da Mulher é um dia de luta. É um dia de mobilização, de manifestações públicas, de debates e de reflexão pela igualdade de gênero e por melhoria das condições de vida para as mulheres. 
No mundo inteiro as mulheres vão às ruas para comemorar as conquistas, protestar contra a violação de direitos, gritar pelo fim da violência doméstica e sexual e reivindicar políticas públicas para a igualdade entre mulheres e homens.
O 8 de Março é mais um dia de luta pela descriminalização do aborto, mais um dia para dizer que nenhuma mulher deve ser presa ou morrer por ter feito um aborto. 
O Dia Internacional da Mulher é um dia de luta pelo direito à diversidade sexual e contra a lesbofobia.
É mais um dia de luta contra todo tipo de discriminação que as mulheres vivenciam em todos os dias do ano.
Portanto, antes de entregar as flores, antes de dar os parabéns e, principalmente antes de fazer aquela piada, lembre-se de tudo isso.
Viva Clara Zétkin, Rosa Luxemburgo, Simone de Beauvoir, Sueli Carneiro, Frida Khalo, Chiquinha Gonzaga, Clementina de Jesus, Eleonora Menicucci, Margarida Alves, Lélia Gonzalez, Patricia Galvão, Chica da Silva, Clara Charf, Safo, Luiza Bairros, Clarice Lispector, Benedita da Silva, Nara Leão, Luz Del Fuego, Carolina Maria de Jesus, Dalva de Oliveira e todas que ousaram e ousam desafiar a ordem patriarcal e machista, racista e branca, heteronormativa. 

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

80 anos da conquista do voto feminino no Brasil.

Hoje, 24 de fevereiro, comemora-se 80 anos do sufrágio feminino no Brasil. Até 1932, somente os homens brancos podiam votar no país. Inicialmente as mulheres puderam votar por meio do Código Eleitoral Provisório, de 24 de fevereiro de 1932. Mas, é bom lembrar  que esta primeira conquista não foi completa: somente as mulheres casadas com autorização dos maridos, viúvas e solteiras com renda própria podiam exercer o direito ao voto.
Os primeiros registros de sufrágio feminino são da cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte no ano de 1928, quando o voto foi autorizado pelo governador Juvenal Lamartine
Segundo a enciclopédia livre, a primeira eleitora do Brasil e da América Latina foi Celina Guimarães Viana, o que ocorreu graças a lei n°660 de 25 de outubro de 1927 que regulava o Serviço Eleitoral no estado do Rio Grande do Norte. Essa lei estabeleceu que não haveria mais distinção de sexo para o exercício do sufrágio e como condição básica de elegibilidade. 
Foi somente em 1934 que as tais restrições foram retiradas do Código Eleitoral e mesmo assim não tornava o voto feminino obrigatório, somente o masculino. Finalmente em 1946 o voto feminino sem restrições passa a ser obrigatório no Brasil.
Mas até chegar à conquista da obrigatoriedade do voto feminino, vale lembrar, foi preciso muita luta e organização das mulheres. Foram décadas de reuniões, marchas, assembleias e manifestações das ativistas que lutaram pelo nosso direito ao voto.
    
Gilka Machado (Imagem:Google)
As feministas e sufragistas Leolinda Daltro e Gilka Machado, fundaram em 1910, na capital federal do Rio de Janeiro, o Partido Republicano Feminino, cujo maior objetivo era o sufrágio feminino. E é importante que se diga: elas tiveram um papel histórico e fundamental na construção do debate público e na mobilização em relação ao direito de voto das mulheres.
Igualmente importante foi a criação da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino em 1922,  no Rio de janeiro, por Bertha Lutz, para defender os interesses das mulheres. Bertha é um símbolo do feminismo na luta sufragista. Foi eleita suplente para deputada federal em 1934 e em 1936 assumiu o mandato. Com o golpe do Estado Novo em 1937 Bertha Lutz perdeu o mandato.

Pagu (Imagem: Google)
A luta das mulheres pelo direito ao voto estende-se do final do século XIX ao início do século XX.
É claro que passados 80 anos do direito feminino ao voto no país, são incontáveis as conquistas das mulheres brasileiras, embora ainda tenhamos uma longa trajetória de luta a percorrer. 
Na política, somos a maioria do eleitorado brasileiro, temos pela primeira vez uma mulher Presidenta do Brasil, mas a nossa representação no Congresso Nacional não condiz com a nossa força. Na Câmara Federal temos apenas 8,77% do total da casa, com 45 deputadas. No Senado, são apenas 12 mulheres para um total de 81 lugares. 
No mercado de trabalho, permanecem as desigualdades entre mulheres e homens. Estudo realizado pelo IBGE entre 2003 e 2011 apontou disparidades entre rendimentos de homens e mulheres e entre brancos, pretos e pardos. Segundo consta na matéria da www.redebrasilatual.com.br "No ano passado, as mulheres ganhavam em média R$ 1.343,81 - 72% do rendimento dos homens (R$1.857, 64). 'A diferença permaneceu constante em relação a 2010, o que interrompe os avanços que ocorreram desde 2007, diz o instituto. A menor proporção foi registrada em 2003 (70, 8%)".
No campo da violência, infelizmente os homens ainda dispõem dos corpos das mulheres da forma como lhes convém. Estupros, assassinatos e espancamentos são frequentes e os índices de violência doméstica são alarmantes. Segundo pesquisa da Fundação Perseu Abramo, a cada dois minutos 5 mulheres são espancadas no Brasil.
Como se pode ver, graças aos movimentos de mulheres e feministas conquistamos o direito ao voto e avançamos em muitos outros direitos. No entanto, ainda há muita luta e desafios pela frente.
Sigamos, pois.

Leia mais:
Voto feminino completa 80 anos nesta sexta
Pagu - A libertária musa do modernismo

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Esperança.

Blogueiras Feministas com a Ministra Eleonora Menicucci
Da esquerda para a direita: Lia Padilha, Natália, Suely Oliveira e Thayz Athayde
Eu fui à posse da ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para as Mulheres. As Blogueiras Feministas foram convidadas para a posse, a transmissão de cargo e a coletiva com a nova ministra. Não tivemos tempo hábil para levar um grupo maior. Era uma sexta-feira e tudo acabou sendo muito em cima da hora. Mesmo assim, as Blogueiras Feministas marcaram presença. Lá estávamos, portanto, eu, Marcelo Caetano, Thayz Athayde, Natália Silveira e Lia Padilha.
Logo na chegada nos deparamos com uma longa fila que só crescia. Pude ver que ali estavam, nos poucos momentos que passei na entrada, trabalhadoras rurais, conselheiras do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, feministas históricas e recentes, gestoras públicas, mulheres de partidos, entre outras. Lá também estava Clara Charf, uma militante em defesa da paz desde a década de 40. Lutou contra o Golpe Militar de 1964 e teve seus direitos cassados. Clara viveu na clandestinidade, foi companheira de Carlos Marighela, que foi assassinado em 1969. É um defensora incansável dos direitos humanos. 

Clara Charf (Foto: Arquivo Pessoal)
A cerimônia de posse da ministra Eleonora Menicucci foi um momento de fortes emoções. E de presenças marcantes. Compareceram pessoas como Amelinha Telles - professora, ex-presa política e integrante da União de Mulheres de São Paulo; Nilmário Miranda - ex-ministro dos Direitos Humanos e atual presidente da Fundação Perseu Abramo; muit@s ex-pres@s políticos junto com seus familiares; Silvia Pimentel - atual presidenta do Comitê para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres das Nações Unidas; Helena Nader - presidenta da SBPC; muitos ministros e ministras; várias autoridades do judiciário; o senador do PT/SP Eduardo Suplicy e a vice-presidente do Senado, a senadora Marta Suplicy do PT/SP, acadêmicos e, claro, muitas representantes dos movimentos feministas  e Lgbt de todo o país.

Foto: arquivo pessoal

Maria Laura (Foto: arquivo pessoal)
Enquanto aguardava a abertura do ato entrevistei algumas das pessoas presentes. Fiz uma única pergunta: quais as expectativas em relação a nomeação da ministra Eleonora Menicucci. Esperança foi a palavra do momento para a maioria, como se pode ver a seguir:
Para Maria Laura, secretária da mulher do PT/DF "a nomeação representa a continuidade de um projeto político e a garantia do compromisso da presidenta Dilma com as políticas para as mulheres. Vejo com muita esperança".

Liège Rocha (foto: arquivo pessoal)
Liège Rocha, Secretária Nacional de Mulheres do PC do B afirma que as expectativas são muito positivas. Segundo Liège, a nomeação dará "um novo impulso à SPM, por tudo que Leo representa e também por tudo que eu já conheço da atuação da companheira feminista".
Paula Beiro, da secretaria nacional de mulheres do PT disse que as expectativas são muito boas. "O reconhecimento que a ministra tem no movimento feminista é muito positivo. Estou animadíssima!"
Elza Campos, da União Brasileira de Mulheres disse que vem à posse com "olhos grandes de esperança". Enfatiza também a história de lutas da ministra e sua competência, produção teórica e acadêmica. Finalizou dizendo que "Dilma acertou em cheio".'
Também as gestoras públicas comemoraram. Maria Teles, secretária da Mulher do estado de Sergipe disse que gostou bastante e que está cheia de esperanças e confiança nos compromissos assumidos por Eleonora Menicucci: "A ministra chega com os ventos favoráveis".
Para Regina Barbosa, do NEPO/Unicamp e também representando no ato a Abrasco, "Hoje é um dia de alegrias. As expectativas são todas maravilhosas. Vamos dar todo apoio para que ela realize e faça um bom trabalho. Com a trajetória de Leo as mulheres realmente se enchem de esperança".

Schuma Schumaher (foto:arquivo pessoal)
Encontrei uma esfuziante Schuma Schumaher, da Redeh/RJ e Articulação de Mulheres Brasileiras que disse: "Estou muito feliz. A Dilma começa enfim a fazer o ministério dela. As expectativas são muitas e grandes, com esse gesto da presidenta escolher uma feminista que tem história e trajetória no movimento. Hoje é um dia de glória!" Para Nalu Faria da Marcha Mundial de Mulheres, as expectativas são as melhores. "A presença de Leo representa a continuidade ao processo que vem se consolidando de inovações em relação às políticas para as mulheres". A Secretária Nacional de Mulheres do PT, Laisy Morière disse que "Espera que a política para as mulheres do governo Dilma avancem ainda mais".
Por fim, encontrei Amelinha Teles,  da União de Mulheres/SP e coordenadora de projetos da Rede de Promotoras Legais que emocionada disse: "Leo é uma mulher reconhecida na luta e na política, comprometida, decidida e empenhada no reconhecimento dos direitos das mulheres. Estou bem feliz e com muita esperança". Nós também.
Amelinha Telles (Foto:Renato de Souza)
E para encerrar esse post, deixo o poema Esperança, de Mário Quintana.
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...

Texto extraído do livro "
Nova Antologia Poética", Editora Globo - São Paulo, 1998, pág. 118.

Leia Mais:

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Nunca antes na história desse país.

Eleonora Menicucci (Imagem: Google)
Nesta 6a.feira, dia 10 de fevereiro será a cerimônia de posse da feminista Eleonora Menicucci como ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres. Para as feministas, muitos motivos para comemorar. Léo, como é chamada por suas companheiras de luta, sabe-se, tem uma posição pública, histórica e contundente a favor da descriminalização do aborto, como se pode verificar na matéria da Carta Maior.
A indicação foi uma festa na blogosfera. Para o bem e para o mal. As feministas, comemoraram. Os conservadores se arrepiaram. E os principais jornais resgataram a biografia de Léo, com riqueza de detalhes. Melhor assim. Nada a esconder. Ex-presa política. Feminista. Bissexual. Como diria o presidente Lula, "Nunca antes na história desse país". Sucesso e muitas realizações, Léo!

A seguir, reproduzo o artigo da feminista Ana Maria Costa. Presidente do CEBES 



"Eleonora Menicucci: Vida Longa, Ministra".

Léo Menicucci, como as companheiras feministas a chamamos, é uma mulher que dedicou sua vida e talento às varias frentes de luta por justiça social, pela dignidade do trabalho, pelo direito à saúde e, especialmente, pela igualdade de direitos entre homens e mulheres.
Nesse sentido e perspectiva, tem na sua  historia  ativa participação nos movimentos feministas,  no seu partido politico e na vida acadêmica como docente e pesquisadora no campo da saúde das mulheres e direitos sexuais e reprodutivos. Léo foi nossa companheira de fundação da Rede Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos, primeira e mais importante iniciativa de articulação de ativistas e entidades nacionais na luta pela saúde das mulheres. Também participa do GrupoTemático sobre Gênero e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, a ABRASCO, do Grupo de Estudos sobre o Aborto da SBPC entre tantas outras caminhadas. É por isso que Léo é, como diria Clair Castilhos que é uma outra feminista histórica, “testada na luta”.
Desde que as iniquidades de gênero saíram do espaço privado e  doméstico e foram  para a esfera publica,  novos confrontos políticos surgiram, nem sempre bem acolhidos pelos setores clássicos da politica. Também é certo que nem sempre os atores do campo da esquerda tenham sido mais receptivos às demandas por ampliação da igualdade de direitos para as mulheres. É  que as questões que sufocam e que são reclamadas nessa luta  envolvem mudanças de valores culturais e morais, conformados na naturalização dos papeis sociais e da desigualdade entre os sexos que são cristalizados pela  moralidade e pelas religiões, particularmente as evangélicas e católica.
Hoje contabilizamos grandes avanços  e conquistas tanto no plano legal como nas politicas sociais e mesmo na vida societária. Estas mudanças têm sido construídas pelo trabalho e atuação de mulheres e homens que, com coragem e sensibilidade politica, deram conta de assumir compromissos de justiça pela dignificação das mulheres brasileiras. O contexto da participação das mulheres na força de trabalho e na economia nacional tem um papel importante nisso tudo. Mas se muito já andamos, mais ainda há que ser feito. O caminho envolve ação  da sociedade, das mulheres mas também do Governo, do Parlamento, enfim, do Estado no seu sentido e significado amplo.
A legalização do aborto é exemplo da dívida que o país ainda tem com as mulheres brasileiras, com a democracia e a saúde publica. É a ilegalidade que remete as mulheres à condição de barbárie da pratica clandestina do aborto, responsável por mortes e comprometimento da saúde. Todas as mulheres, de todas as classes sociais e níveis de escolaridade engravidam sem querer  ou sem poder prosseguir na gestação e acabam recorrendo ao aborto. As pobres arriscam suas vidas e morrem. Essa injustiça é intolerável. 
A despeito do Ministro Temporão ter, solitariamente, pautado o tema na sua gestão, pouco pôde ser feito. O Ministério da Saúde atual tem tido ouvidos de mercador no que diz respeito ao aborto e das perversidades que produz para a saúde das mulheres e , por isso, nada incluiu como proposta para seus projetos. Sua politica conseguiu voltar a décadas atrás e reificar o papel social das mulheres no estrito lugar da maternidade, agora infantilizadas na marca da Rede Cegonha.
A Ministra Eleonora Menecucci assume a tarefa de pautar a temática no interior do Governo e das politicas públicas, mesmo que a solução definitiva da legalização do aborto possa continuar remetida à agenda do poder legislativo por um executivo acuado mediante a configuração de sua base de sustentação politica no parlamento. Adotando esse caminho, ela contará com o apoio das mulheres brasileiras e também dos homens  incluindo os que conseguem distinguir valores e moralidades religiosas pessoais de sua ação publica, a qual deve sempre preservar o interesse publico no centro dos objetivos da prática politica.
O Brasil dos últimos tempos perseguiu um lugar no mundo e conquistou um papel protagonista no plano da politica internacional  e, nesse cenário globalizado exposto ao capital financeiro e suas crises frequentes, se impôs entre as  economias mais robustas contemporâneas. Se, na visibilidade externa o Brasil está bem na foto, internamente nossos problemas são persistentes e agravados: desigualdades sociais , recuo e fragilidade das políticas sociais universais, dos direitos sociais, dos direitos humanos e dos direitos sexuais e reprodutivos,  configuram alguns desses problemas. Estas persistentes questões  se interagem e se acumulam determinando a precariedade das condições de vida dos pobres, negros e outros grupos sociais. Nestes grupos as mulheres são especialmente atingidas.  Logo, os desafios para nossa Ministra são enormes e é por isso que desejamos, vida longa à Ministra Léo.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Orlando. Um único corpo, múltiplos indivíduos


Vita Sackville-West (Imagem: Google)
                                                                      
Vita Sackville-West foi uma poetisa, romancista e jardineira que viveu entre 1892 e 1962. Recebeu por duas vezes o Hawthornden Prize, um importante prêmio por seus poemas. 

Era uma aristocrata que se rebelou contra as normas e os padrões estabelecidos pela sociedade de sua época. Viveu intensas paixões e se casou com Harold Nicholson que era diplomata, jornalista, autor de biografias e romances e bissexual, tanto quanto Vita. Ambos viveram várias histórias homossexuais extraconjugais, que pouco afetou o casamento deles. Era um casal moderno e à frente do seu tempo. Era uma relação aberta, onde cada um tinha a liberdade de viver histórias de amor ou de sexo, conforme o seu desejo, rejeitando  as convenções matrimoniais regidas pela exclusividade.

Violet Trefusis
     
              
Das histórias de amor lésbico vividas por Vita Sackville-West talvez a mais longa e conturbada  tenha sido com Violet Trefusis, uma amiga de infância, cujo romance se iniciou ainda na adolescência. Muitas vezes, depois de casada com Harold, Vita se vestia com roupas de homem, se fingindo de rapaz e partia com sua Violet na maioria da vezes para a França. Vita adotou um nome masculino que ela usava nessas ocasiões: Julian.

As cartas de amor trocadas por elas foram reunidas e publicadas, resultando no livro que conta alguns detalhes dos encontros, das férias que passavam juntas, dos conflitos vividos por elas e também do ciúme que Violet sentia de Vita. Ela queria uma exclusividade que Vita nunca pode oferecer.   
Também uma outra publicação conta a história de amor de Vita e Violet. Pelo menos em parte. O livro Orlando (1928), de Virginia Woolf  tem como inspiração biográfica a vida de Vita Sackville-West com quem ela viveu uma linda história de amor já no final da década de 1920.
Orlando era um jovem cônsul inglês que nasceu na Inglaterra da Idade Moderna e um dia após muitos séculos como homem, depois de dormir por sete dias quando estava na Turquia, ele acorda  e descobre que agora o seu corpo é de mulher.Quando volta à terra natal Orlando precisa enfrentar as duas possibilidades de sua nova vida: ser homem e ser mulher. Aparentemente Orlando conquista a imortalidade e o livro conta a sua vida no período entre 1600 e 1928, ocasião em que o livro é escrito. 

É uma história completamente atual e, como bem registra a enciclopédia livre "que expressa as ambiguidades da identidade feminina e masculina e suas relações com a condição humana". Orlando era Vita Sackville-West (ou o seria o seu contrário?), um homem que se transforma em mulher e, nas palavras da própria Orlando "a história de alguém que busca a vida e o amor". O livro é uma bela homenagem de Virginia Woolf à Vita e, segundo Nigel Nicolson, filho de Vita "a mais longa e mais encantadora carta de amor de toda a literatura".





O livro de Virginia Woolf teve várias adaptações para o teatro e uma para o cinema em 1992.  Orlando é um filme de Sally Potter, tendo não por acaso a atriz Tilda Switton no papel principal. Eu o assisti na época em que ele foi lançado no Brasil, no início dos anos 90. É um filme com momentos hilários, que registra algumas das ambiguidades vividas pela personagem, como seus namoros e decepções amorosas, a nova vida com os dois sexos e o amor pelo misterioso Shelmerdine (Billy Zane), com quem ela terá um filho. A melhor e talvez a mais completa crítica que li sobre o filme Orlando está no Clube do Livro. Vejam trecho a seguir:

"O mais importante é perceber que Swinton nos faz esquecer, na primeira metade do filme, que ela é de fato uma mulher interpretando um homem, tamanha é a qualidade de sua composição. Potter ainda se permite brincar, em outros momentos, com a questão de gênero, ao escalar o ator Quentin Crisp (ótimo!) para interpretar ninguém menos que a Rainha Elizabeth I. E o que dizer de Billy Zane que, no filme parece carregar mais feminilidade que Orlando, já metamorfizado em mulher?"

Virginia Woolf e Vita Sackville-West (imagem: Google)


segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Só uma opinião.

Imagem: Google

Ando com muita preguiça de escrever. Inicialmente eu pensava que era porque ainda estou de férias, longe do trabalho e contaminada pelo clima de carnaval que anda tomando conta de Recife. 
Mas não é nada disso. O ano apenas está começando mas as notícias parecem muito velhas. Não parecem notícias de ano novo. Estão mais para reedições de velhas manchetes.

No Brasil, a notícia de maior repercussão na mídia na terceira semana do ano, foi o caso de violência sexual no programa da Globo BBB12, envolvendo o modelo-brother Daniel Echaniz e a sister-estudante Monique Amin. Como sempre acontece o programa promove uma festa, entope @s participantes de bebida alcoólica e aguarda o que a produção deve considerar 'os melhores momentos', que são transmitidos ao vivo em pay-per-view e editados para mostrar no dia seguinte. 
Na festa do sábado, tais momentos viraram caso de polícia. Já durante a madrugada do domingo (15/01) internautas exigiam a expulsão de Daniel e durante todo o dia esteve entre os assuntos mais comentados no twitter acompanhado da hashtag #Danielexpulso. No facebook e nos blogs também foi o assunto mais comentado. 

Marcha das Vadias - Recife
(Foto: acervo pessoal)
Daniel foi expulso do programa mas antes e depois disso todo tipo de baixaria circulou na internet e na imprensa. Uma mistura de machismo, racismo e misoginia deram o tom, reafirmando velhas facetas e ressuscitando ditados infames. Mas as feministas não deixaram por menos e enfrentaram tudo com maestria escrevendo sem parar, organizando atos de protesto e também exigindo a responsabilização da TV Globo
Na minha opinião houve sim, estupro no programa BBB12. A sister, que estava completamente desacordada pelo efeito do álcool ingerido, negou que houve violência sexual. Respeito o que ela diz. Sou solidária. Imagino a pressão que ela está sofrendo ali naquele serpentário chamado Projac. Mas isso é só uma opinião. O que vai acontecer, não sabemos. Aguardemos, pois. 

Leia também:
Polêmica do 'BBB' se espalha pela imprensa internacional
Em caso de dúvida, não estupre.
Biscate Social Club.
Operação Abafa lembra piores momentos da Globo

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Parabéns, querida Simone! Sempre!

Simone de Beauvoir (Imagem:Google)

Simone de Beauvoir nasceu em Paris, no dia 9 de janeiro de 1908.
"Nasci, às quatro horas da manhã, a 9 de janeiro de 1908, num quarto de móveis laqueados de branco e que dava para o Bulevar Raspail. Nas fotografias de família, tiradas no verão seguinte, vêem-se senhoras de vestidos compridos e chapéus empenados de plumas de avestruz, senhores de palhetas de panamás sorrindo para o bebê: são meus pais, meu avô, meus tios, minhas tias, e sou eu. Meu pai tinha trinta anos, minha mãe vinte e um, e eu era a primeira filha".
Com esse trecho Simone de Beauvoir começa o livro "Memórias de uma moça bem-comportada (ed. Nova Fronteira, 1983), um auto-retrato denso e realista. 
Simone era também uma memorialista contundente, verdadeira, que não poupava nem 
a si mesma.  O livro faz uma crítica aos valores da burguesia e é também um importante registro do movimento existencialista francês. 

Simone de Beauvoir foi escritora, filósofa e feminista. Não necessariamente nessa ordem. Ela estudou Letras, Matemática e Filosofia. Queria ser professora, até se tornar escritora. Simone de Beauvoir foi revolucionária em tudo que fez. No rompimento com a família, criticando a aristocracia francesa, os princípios católicos-burgueses. Estabelece com Jean-Paul Sartre um pacto de lealdade - onde a monogamia e a mentira nunca teriam lugar, mesmo que isso provocasse sofrimento. Para Sartre, antes de serem amantes, eles eram escritores e por isso deveriam conhecer profundamente a alma humana, como consta no site Simone de Beauvoir: "multiplicando suas experiências individuais e contando-as, um ao outro, nos mínimos detalhes. Entre Simone e Sartre o amor seria necessário, com as demais pessoas, seria contingente. Beauvoir aceita o pacto, pois ele está de acordo com suas próprias convicções". 

Eu gosto de tudo em Simone. Sua vida. Seu casamento aberto com Sartre. Suas histórias de paixões intensas por mulheres e homens. Seus triângulos amorosos. Viveu um longo caso de amor que se estendeu por quase vinte anos com Nelson Algren. O livro Cartas a Nelson Algren: um amor transatlântico, 1947-1964 (Rio de Janeiro, Nova Fronteira), descreve a intensidade desse romance, um amor que a tocou profundamente. 

Escandalizou na Universidade de Sorbonne em que dava aulas porque vivia em concubinato há anos com Sartre, porque dava aulas sobre escritores homossexuais - como Proust e Gide e também por ser bissexual. Tudo isso devia enlouquecer o reitor daquela universidade.        
        



Mas o que eu mais gosto em Simone de Beauvoir é a revolução que ela provocou quando escreveu o livro O Segundo Sexo, em 1949. Publicado em dois volumes, O Segundo Sexo fala sobre a condição feminina, a sexualidade, o corpo da mulher, questiona Freud e é considerado um marco do feminismo. 

                  "... não acredito que existam qualidades, modos de vida especificamente femininos: seria admitir a existência de uma natureza feminina, quer dizer, aderir a um mito inventado pelos homens para prender as mulheres na sua condição de oprimidas. Não se trata para a mulher de se afirmar como mulher, mas de tornarem-se seres humanos na sua integridade".
Simone de Beauvoir morreu em 1986, mas deixou um legado tão rico, grandioso e importante pro feminismo que é uma pena que nem todas as mulheres saibam que um dia ela existiu. 
Parabéns, Simone. Sempre!

As fotos do post são todas do google imagens.
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