quarta-feira, 4 de junho de 2014

#AbortoLegal para não morrer

No dia 21 de maio, foi publicada a Portaria n° 415, de 21 de maio de 2014, que inclui o procedimento para "interrupção da gestação/antecipação terapêutica do parto previstas em lei e todos os seus atributos na Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses/Próteses e Materiais especiais do Sistema Único de Saúde (SUS)". Para saber mais clique AQUI.

Como nós sabemos, no Brasil o aborto é legalmente permitido em apenas três casos: quando a gravidez resulta de estupro, quando a gestante corre risco de vida e quando o feto é anencéfalo - feto diagnosticado com uma malformação no tubo neural, quando há ausência parcial no encéfalo e da calota craniana.

Nos dois primeiros casos, a lei é regulamentada desde 1940, de acordo com o Artigo 128 do Código Penal, mas somente com a lei n° 12.845   sancionada pela presidenta Dilma em 1° de agosto de 2013, o atendimento passa a ser obrigatório no SUS para aquelas mulheres que decidirem interromper uma gravidez resultante de estupro. A Lei 12.845/2003 dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual.

Muita gente já ouviu falar sobre aborto legal no Brasil, mas não tem ideia de como funciona e onde estão esses serviços. Você conhece algum serviço de aborto legal em sua cidade? Sabe quantos existem atualmente no Brasil? E como uma mulher que necessita do serviço deve proceder? A Pública - Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo - escreveu um texto bastante elucidativo e detalhado sobre o aborto legal no Brasil inclusive sobre hospitais de referência. Para ler o texto Dor em Dobro acesse AQUI.

Quando o aborto está previsto na lei, é permitido às mulheres que decidem interromper a gravidez, serem atendidas pelo Sistema Único de Saúde e, por isso, é preciso que o Ministério da Saúde regulamente esse tipo de atendimento.

A Portaria 415 não ampliou a interrupção da gravidez para outros casos.
A Portaria 415 não descriminalizou e nem legalizou o aborto no Brasil.

A Portaria 415 apenas estabelece o registro específico na tabela do SUS dos procedimentos do aborto previsto em lei. Tão somente isto. Mesmo assim, em poucas horas da publicação da Portaria n° 415, uma enxurrada de mentiras foi espalhada nos meios de comunicação. Governo oficializa aborto e paga R$ 443 pelo SUS foi apenas uma das grandes mentiras divulgadas e amplamente compartilhada.



Explicando o que não tem explicação. Não deu tempo de comemorar os avanços da Portaria n°415 para a garantia dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres porque o Ministro da Saúde, Arthur Chioro revogou com outra portaria, de n° 437, de 29 de maio de 2014, por infeliz ironia, um dia depois do 28 de Maio - Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher e Dia Nacional de Redução da Mortalidade Materna. O Ministério da Saúde declarou à Forum que a revogação se deu porque a mesma "não foi pactuada internamente entre os gestores", possuindo "inconsistência de redação e de gastos".

Infelizmente a revogação representa um grande retrocesso na vida das mulheres e nós não vamos aceitar de braços cruzados a decisão do ministro. Nenhum direito a menos!

Reproduzo -  e apoio - a nota pública de várias organizações de mulheres e feministas, dirigida ao Ministro Chioro em 29 de maio de 2014:

Nós, do movimento feminista, movimentos sociais, instituições e profissionais, abaixo assinadas(os), que atuamos em defesa dos direitos humanos e da saúde integral das mulheres, indagamos sobre quais motivos levaram a tal revogação. Que fundamentos basearam tal medida? Do nosso ponto de vista, é uma medida que representa um retrocesso, ao considerarmos que:
  • A Portaria No 415 está em conformidade com leis, normas e decretos que garantem o atendimento das mulheres nos serviços de saúde;
  • A Portaria No 415 permite a identificação do procedimento como “Interrupção da Gestação/Antecipação Terapêutica do Parto Prevista em Lei”, com a especificação dos códigos da Classificação Internacional de Doenças (CIDs) referente ao “aborto por razões médicas e legais” e os CIDs secundários de “agressão sexual por meio de força física”, “abuso sexual”, “anencefalia” ou “supervisão de gravidez de alto risco”, circunstâncias em que a interrupção da gestação já é legal. Revogar este avanço significa retornar a uma situação de imprecisão que dificulta a obtenção de estatísticas nesta área, pela subnotificação desses procedimentos no SUS. Um sistema de informação eficaz é base para obter com precisão dados sobre a saúde reprodutiva das mulheres e condição para formulação e monitoramento de políticas públicas. Portaria No415 avança neste sentido;
  • A Portaria N415 estabelece e enfatiza o direito a acompanhante durante esses procedimentos. Sua revogação vai contra as regras de humanização da assistência e favorece o ambiente de violência obstétrica;
  • Com a revogação da Portaria N415, voltaremos a uma situação de dificuldade para as mulheres de acesso ao aborto legal e ao atendimento nos casos de violência sexual pela rede de atendimento do Sistema Único de Saúde;
  • A redução do aporte financeiro com a revogação da Portaria N415 ameaça a qualidade e segurança destes atendimentos na rede pública de saúde.
Temos esperança de que esta revogação seja corrigida, solicitamos deste Ministério explicações sobre a medida de retrocesso.
29 de maio de 2014.
Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto
Articulação de Mulheres Brasileiras AMB
Marcha Mundial das Mulheres
Central Única dos Trabalhadores (CUT)
Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia
CLADEM – Comitê Latinoamericano e Caribenho em Defesa dos Direitos da Mulher
UNE – União Nacional dos Estudantes
Ubes – União Brasileira dos Estudantes Secundaristas
UJS – União da Juventude Socialista
Global Doctors for Choice - Brasil
CEPIA – Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação
Católicas pelo Direito de Decidir (CDD)
Grupo Curumim
Cunhã Coletivo Feminista
CFEMEA Centro Feminista de Estudos e Assessoria
União Brasileira de Mulheres UBM
Casa da Mulher Catarina
Comissão Nacional de Violência Sexual
Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia FEBRASGO
Por isso, a luta continua. Na próxima sexta-feira, dia 06 de junho tem twittaço com a tag #AbortoLegal e no sábado tem Ato Público na cidade de São Paulo


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